Acendi um cigarro enquanto ouvia superficialmente ela falando e falando e falando e falando sem parar... Sobre um assunto qualquer que eu juro, não me atentei muito mesmo. Articulava bastante com as mãos enquanto abotoava os botões da calça, eu não ouvia nada. Nadinha. Não por maldade... Mas...
Sei lá.
Ando relapsa um tanto.
Ando distraída um tanto.
Ando voando um tanto por aí.
E lá estava ela... ainda.
Seu cheiro, seu beijo, sua buceta, seu caos. Tudo num puro suco de apatia crônica. Deixando todo meu quarto quente, mas cinza.
Ela estava lá.
E continuava lá.
Procurava seu sutiã cor de rosa enquanto eu soprava o cigarro em direção à janela prestando atenção nos carros, nas avenidas, nas pessoas lá embaixo, nos pombos nojentos que moram no centro, em tudo... menos nela.
- Tá ali ó... - apontei com a cabeça onde estava a peça que ela procurava, e ela vestia-se como quem tinha se arrependido de ter se despido. E falava como quem queria me encher de conteúdo mentalmente problemático explícito. Nua, ela me prometia promessas vestidas de sonhos irreais. Verdades mentirosas.
Penso que ela poderia só vir e trepar comigo, na paz, não precisa me prometer nada. Mas ela o faz. Ela diz que toda vez que vem até aqui é como se fosse uma nova carta de amor que ela me escreve.
Será que ela quer encobrir que é só sexo?
O que ela quer, afinal? Palavras não amam ninguém e o amor, na minha concepção é mais do que a vinda apressada dela, mais que eu ser diversão, mais que ser amante.
Eu não sei o que ela quer, mas eu entrego uma caixa misteriosa contendo prazer carnal. Boca na boca, pele na pele. Sem amor, só corpo, só toques, só pele, só trepadas pra tirar ela do tédio, rasgar a rotina, corpos nus pra encantar a retina.
Ela me oferece corpo e presença, mas não alma. Acho que pela manhã nós duas sequer faremos sentido na minha cabeça. Somos encontro de corpos, não de coração e alma.
É isso que pesa.
Ela quer amor, diz que temos uma ligação, eu digo que não há disponibilidade aqui porque quando eu ligo a linha está ocupada pra mim. Enfim.
Meu cigarro acaba quando ela está amarrando os cadarços do seu tênis. Não acredito que nosso amor dura o tempo de um Marlboro. Eu olho pra ela então, concordo com tudo que não ouvi, finjo que em nenhum momento eu me distraí.
Eu não sei mais o que ela espera de mim e na verdade, eu só espero que ela não espere muito. Eu tento manter ela nas memórias que posso esquecer... Ela e as cartas de amor... que eu nunca li.
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