Quase não acreditei ao vê-la adentrando meu prédio. Não pisou na placa de metal, segundo ela em respeito à mim. Os anos deixaram ela mais engraçadinha e empática. Já falei que aos meus olhos é estranho ver ela e meu bairro juntos no mesmo quadro, né? Então... Ainda não encaixa mesmo, mas ela veio mesmo assim. Pela primeira vez acho que eu quis lidar com isso logo de uma vez, totalmente curiosa pra saber a motivação da visita inesperada. Olhei pra ela e tive a impressão de ser tudo novo, tudo. Falo do sentimento como um todo. Aquela sensação gostosa de quando a gente se apaixona, sabe? Quando tudo ainda tá bem fresco e quente, o vapor de um novo amor ou qualquer equivalente. Tudo soou novo, gosto de mulher que me deixa nervosa. E eu até gostei da surpresa madrugadeira que ela me fez desse vez.
Subiu reclamando dos degraus, normal. Entrou no meu quarto e eu nem tenho certeza se ela esteve aqui mais do que - chutando muito alto - cinco vezes antes. Foi estranho olhar pras coisas dela espalhadas na minha cama, minha parede preta, as placas roubadas... Tudo junto, bastante misturado. Tudo encaixado. Parecia sonho. Daqueles que são dahora, no caso.
- A parede não era assim antes, né? - tocou a parede e encostou, me fuzilando como quem me convocava pra beijar ela grudada nessa parede preta, me chamando com aquele olhar dela que me convida pra pular em cima, pra puxar pela cintura beijando a boca, sem medida nenhuma, sem modos, isso é coisa bastante batida que ela faz porque sabe que eu não consigo resistir, e sim... eu sigo péssima em resistir à mulher que me olha assim, tipo como ela me olha. Não que ela monopolize o olhar, não que seja exclusividade dela... É aquele olhar de "me pega". Ela é dona, somente, do olhar que deixa minha buceta molhada mas também não monopoliza isso. Enfim, acenei com a cabeça que não, indicando que não era preta mesmo antes e achei a pergunta até um pouco sem sentido. Ela se aproximou de mim.
- Me beija? - Fechei os olhos, sorrindo, esperando que ela me beijasse, como nesses filmes românticos que ela adora. E eu sei que eu não precisava pedir, mas eu quis permitir a aproximação dela assim... de forma verbal e clara. Quase como um contrato. Ela sabe que eu valorizo muitíssimo as palavras, tal qual valorizo o silêncio de tudo que não precisa ser falado e o silêncio como um todo. Porque silêncio pra mim é raro.
Me abraçou então como quem não me via há anos, mas tem me visto pra caralho nos últimos tempos. Foi bom. O beijo veio logo após o abraço apertado, me cheirou o pescoço, a cara, meu corpo... igual cheira essa cocaína que ela não larga nunca. E eu pensei que talvez a gente tenha se visto mais na casualidade, no impulso, na loucura igual agora do que sob qualquer outro rótulo que a gente teve antes. E isso também é bom.
Em poucos segundos juntas quando estamos dispostas nós vamos de 0 à 100, tudo muito rápido, sem enjoar. Com a gente as coisas acontecem muito rápido mesmo, basta um beijo. Não dá pra beijar ela dentro do meu quarto sem desejar profundamente trepar com ela. Sem desejar que ela arranque minha calcinha nos primeiros trinta minutos juntas, sem desejar ser chupada por ela.
E nós transamos na frente do espelho da porta, encostadas na parede e na cadeira. Eu nunca sei porque eu vou, mas sempre sei porque ela vem.
Ela nua pela casa, para e me encara, nós duas sem máscaras alguma, quase cruas, o relógio aponta que já é quase a virada de um novo dia. Quando ela me encara, me rouba o ar, me tira até a linha de raciocínio.
É revigorante, o abraço, o cheiro... Caralho. É o mais próximo de paz emocional que eu já senti nessa vida, e também o oposto. Acho importante. É como se nada pudesse me parar ou me tirar dos braços dela agora. Talvez não possa.
Por um momento, enquanto a gente tava ali deitada juntas na minha cama, sujando meus lençóis com suor, e ela acarinhava minha nuca, senti como se nunca tivesse deixado de ser "mulher dela". E eu achava até engraçado o termo. Ri e pensei que responderia o mesmo que eu mais nova teria respondido "Te pertenço só aqui, enquanto eu estiver aqui". Não gosto e nunca gostei da sensação de pertencimento porque a liberdade é fundamental.
Enquanto me olhava eu senti que poderia levá-la pra qualquer lugar. Qualquer convite que eu fizesse agora eu sei que ela aceitaria porque eu a conheço o suficiente pra saber que eu dominei a mente dela nesse segundo, só pelo olhar. Porra louca do caralho. Qualquer convite... Mas por qualquer razão não existia nenhum outro lugar tão simbólico e especial que eu a quisesse, comigo, senão aqui.
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