Eu penso demais. Racionalizo o máximo que posso, quebro tudo em pedacinhos na minha cabeça. Mas, ainda assim, eu sinto. Juro, eu sinto.
Eu acredito que sentimento é só uma reação química, psíquica, uma resposta automática da mente.
Como se a cabeça fosse uma salinha apertada, cheia de papelada e carimbos, onde tudo precisa passar por um protocolo antes de existir.
E olha... nada me faz acreditar no contrário.
Mas agora... agora, meu corpo ainda quente do que aconteceu, eu percebo: tem coisa que escapa. Tem coisa que fura protocolo, ignora senha, invade a sala sem bater.
Tipo ela.
Ontem o apartamento dela ali, no mesmo nono andar de sempre, estava com cheiro de vinho barato, baseado e cigarro Marlboro Blue Ice esquecido, queimando solitário no cinzeiro. E, ainda assim, era um lugar onde eu queria ficar.
A música baixa tocava Nana Caymmi como se nosso querer prestasse, fosse digno. O sofá desarrumado, e ela me olhando como se já tivesse me despido horas antes. Talvez tivesse.
Mas enfim, voltando pra mim... Quando ela encostou na minha cintura, foi como se alguém desligasse a luz da salinha burocrática dentro de mim. Silêncio. Nenhuma planilha. Nenhuma dúvida. Nenhuma demanda especial. Só toque. O toque dela. Calmo, mas firme, suave e claramente cheio de intenção. E eu, que sempre controlo tudo, deixei.
Mas agora é domingo à noite. E a culpa chegou. Atrasada, mas chegou.
Veio com a mesma força daquele beijo, mas sem o mesmo gosto. Veio como um sussurro de um lamento triste ao pé do ouvido.
Porque não devia ser ela, com ela.
Porque eu não devia querer de novo.
Porque, mesmo racionalizando tudo... eu sinto.
Sinto culpa.
Sinto desejo.
Sinto ela, ainda.
E o pior?
Quero sentir de novo.
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