Sou preenchida em agonia, noventa porcento de mim é isso, uma fonte imensa de agonia e angústia. É como se eu fosse o louco, vivendo num mundo de louco, um mundo de ponta cabeça, igual nos gibis que eu li quando eu era criança. Mas terror nenhum, acho que me adaptei à ser eu mesma e as escolhas ruins que sempre faço... É só frieza, e às vezes tenho convicção de que estou de fato num mundo do avesso, principalmente quando meu coração abruptamente vem à boca. O plantão dos moleques já está quase no fim, o meu também e a cada término de dia o ar me parece cada vez mais pesado, é como se eu tivesse que fazer o dobro de esforço que normalmente faria só pra conseguir deixar um fio de ar entrar, ou algo assim. E quando eu caio em mim, meu "eu-tranquila", normalmente eu estou respirando normal. A última hora parece uma subjetiva tentativa real de sobrevivência, mesmo quando não é, e mesmo que eu esteja bem, mais um dia bem, minha cabeça é somente caos, meus pensamentos se cruzam, se embaralham, seguem num fluxo sem rumo, é cada um pra um lado e hora ou outra eu só pesco um deles pra conseguir me distrair. Hora funciona, hora não. Fazer o quê?
O tempo todo é alma, mente e coração... todos inquietos, compulsivos, transbordando sentimentos que não combinam comigo. Mantenho o corpo e a cara fechada.
E assim seguimos.
Até que me sinto bem, viva, menos perdida nos últimos anos. Não sei se afirmo com muita certeza, mas me sinto dessa forma. Até que bem. Viva, ainda pulso. Olho pro espelho na porta e já não sei mais o que esperar. Mas eu sempre espero algo que treine meu reflexo, minha disposição, minha febre. Eu nunca errei um tiro sequer.
Sensação estranha, oposta ao que eu sou de verdade, me transforma num ser estranho até pra mim, eu me sinto como se estivesse habitando um corpo que não é mais meu, dividindo pensamentos com alguém que não condiz comigo há algum tempo, sensação que me tira de mim, me dá maldade, faz meu dia ter muito mais que vinte e quatro horas, faz meu dia prolongar.
Tem dias que toda essa misturada de sentimentos fazem meu dia iniciar mais cedo, mas também tem dias que minha cabeça nem ao menos me deixa dormir.
Eu respiro fundo... solto o ar. Respiro, inspiro e repito isso uma, duas, três, dez, trinta, cinquenta vezes e nada. Não funciona. Nada ajuda. Acendo mais um baseado na tentativa de acalmar a maré de pensamentos, não é a melhor solução, mas era pior antes quando eu dava uns tiros pra me manter acordada, acho que também me mantinha viva e mantinha no foco de que era só mais uma noite onde eu estava pensando somente em salvar alguém, amar alguém, fugir dali e sobreviver. Sobrevivência e subsistência. Tudo é sobre dinheiro, sempre foi.
Da minha localização, nunca explanada, eu vejo apenas um semáforo distante, que eu já memorizei o intervalo de segundos entre verde, amarelo e vermelho. É a única coisa que eu vejo daqui com um pouco mais de clareza. E também vejo estreitas ruas desertas, com nomes de número mas que não acrescentam em nada porque nunca me levaram à lugar nenhum.
Nenhuma movimentação, mantenho a atenção mas é mais um dia de paz. Eu visto a máscara que venho usando há um tempo, aquela que me deixa aparentar ser tão feliz.
Lá fora a madrugada já encerra seu show, faço minha oração e agradeço por mais um dia que vivi do início ao fim, mais vinte e quatro horas respirando, pulsando... e o silêncio é tanto que eu até consigo escutar meu próprio coração batendo, abro uma fresta da janela e lá fora o Sol já brilha tímido, mas aqui dentro o vazio costurado em tons escuros ainda predomina. Torço para que Ogum e meu Exu Mirim permitam que amanhã seja tão tranquilo quanto hoje.
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