sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

Escrevo por falta de ti.

Mesmo depois de nove anos ainda é sobre eu nunca ter reaprendido a existir.
Hoje. Dia Dezoito de Dezembro de Dois Mil e Quatorze. Três mil, duzentos e oitenta e cinco dias depois. Ainda é como se eu continuasse mesmo sendo só sendo figurante na minha própria vida, sabe? Entende? Só parte da paisagem. A moldura que nunca salvou o quadro ruim.

Você vive...?

Hoje não foi um dia diferente, tirando que minha cabeça acordou fervendo, borbulhando situações que eu acho que nem existem e mil problemas com a mesma consistência de um punhado de açúcar....
Eu acordei, olhei pro lado e foi como se o dia fosse se repetir. Ela estava ali, linda como você naquela manhã de domingo. Era domingo. Um bom dia seguido de um sorriso. Quis sair daquele quarto, quis desejar não ter acordado... Nem cinco minutos e meus pensamentos já me engoliram e me cuspiram tantas vezes.
Bom dia, ela me deu. Bom? Não, e também não era meu dia. Hoje não me atrasei pro trabalho. Hoje não choveu. Teve um tiroteio no shopping hoje. Eu sobrevivi por mais um ano. Nove anos. Quem diria que eu chegaria ao nono ano praticamente ilesa? Você só não vê nenhuma cicatriz porque eu visto sempre o meu melhor sorriso e saio por aí.

Você vive?

Essa saudade que eu sinto que não acalma, me sufoca, entope minhas veias.
Sinto sua falta de verdade. Mesmo. Juro, juradinho. Sinto saudade da sua voz de passarinho ecoando no quarto, na casa... Saudade do seu cheiro, sorriso, olhos. Saudade do gosto do vinho ruim quando eu te beijava aos sábados, especialmente aos sábados porque estranhamente era sua rotina de só tomar vinho aos sábados. Você e suas maluquices. Parecia que você vivia num mundo só seu, sempre desconfiei. Saudade da sua calma, da sua brisa, desse teu sorriso, do seu toque. De você. De papear sobre o tempo, sobre novela, sobre aquele filme ruim que eu dormi no meio, sobre a obra que vai inaugurar no centro da cidade, saudade do som que você fazia meu corpo ecoar. Você sempre deixou meu mundo num tom diferente. Saudade de você reclamando do cheiro do meu beck no seu cabelo, de ouvir você reclamando que eu comprei pepsi ao invés de coca, saudade de te ver feliz com o trampo novo que você tava querendo tanto. Saudade de te ver feliz. Saudade de te ver. Saudade.

Você vive!

Adquiri uma nova personalidade nos últimos nove anos. Parei de beber, parei de cheirar, a vida breve e louca agora já não me atrai. Voltei a morar na mesma casa de antes. Te orgulha de mim! Me desfiz de memórias, logo eu né? Percebi que ao tirar aquele casaco de trás daquela porta e me desfazer de você, eu me desfiz de mim também. Com você eu consegui ser eu de um jeito que nunca mais vou conseguir ser nem sequer comigo mesma. Hoje sinto-me como se eu fosse inquilina em meu próprio corpo, como um parasita mesmo.
Todos os dias eu encontro um sorriso largado dentro de um armário ou de uma gaveta qualquer, visto porque me cabe, viro a maçaneta e saio de mim pra ser feliz, faço piadas o tempo todo, acho que se eu fizesse diferente disso eu nunca conseguiria terminar uma frase sem minha cabeça me interromper, foda. Eu encontro em cada tropeço um pouco de você, mas não foi hoje...
Dei bom dia para minha companhia e não pude deixar de desejar logo te encontrar quem sabe e com sorte em uma próxima vida. Te buscarei por cada uma das minhas existências, esteja certa disso.
Vivre vite mourir jeune, meu amor.

De um jeito ou de outro você ainda vive... mas eu nunca mais reaprendi a existir.



quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

Ninguém bate.

É quase natal, mais um.
Acho que de hoje até lá só restam mais vinte e um dias. Vinte e dois, disse Francisco. Nem sei se o nome dele é mesmo Francisco, mas sei que é quase natal.
Mais um.
Ainda não entrei no clima natalino e nem as pessoas, eu acho. Hoje estava indo para o trabalho e vi uma batida de trânsito. Foi rápido. Nada demais. O carro rodou na avenida, só foi meio estranho de ver. Um cara fechou uma senhora. Ele mandou ela tomar no cu, não achei de bom tom, fervi tão facilmente que por um milésimo de segundo tive vontade de chutar o retrovisor dele, tirar ele de dentro do carro pela janela. Fui consumida pela raiva, sempre sou, mas dessa vez foi tão rápido que eu imagino que todo pavio é muito, muito curto. Ele estava errado, mas com certeza quem tomou no cu foi ela. Não é a primeira batida que vejo ou participo, estar em um acidente é assustador, você se sente extremamente vulnerável, mesmo que não seja nada grave. Seu cérebro funciona mais lentamente, você não entende de primeira, precisa de alguns segundos, minutos pra assimilar. E fora meus sonhos recorrentes com aviões caindo, onde eu sinto o exato momento onde o avião toca o solo, sinto o chão tremer embaixo dos meus pés. Toda vez aviões caindo... Às vezes eu consigo sentir o calor da explosão também, geralmente minha temperatura corporal aumenta consideravelmente. Um looping de sonho há anos. Um saco. Nunca consegui entrar num avião com medo de que isso fosse algum tipo de aviso, presságio mesmo. Mas pode não ser porra nenhuma também. E que se foda.
Esse final de ano me proporcionou andar muito pelas ruas, evento pra evento, de shopping pra shopping. Todos os últimos quarenta dias de cidade em cidade, estado em estado e notei que não vi aquelas decorações natalinas extravagantes, tinha muito disso quando eu era mais nova. Não sei exatamente quando foi que sumiram as casas cheias de pisca pisca e imagens do Papai Noel em seu trenó com suas renas com nariz tão vermelho que parecem meus amigos que cheiram pó, acho que quase ninguém mais faz isso, ano que vem eu tenho certeza que vou morar fora daqui, desse caos, dessa bagunça e muito, muito longe da rota dos aviões. Talvez um novo ambiente seja diferente. Me traga algo diferente. Já seria ótimo que eu tivesse sonhos diferentes.

Minha mãe colocou uma meia na porta, uma espécie de enfeite natalino. Nunca entendi o porquê da meia, mas é sempre a mesma meia pendurada na porta. Meu vizinho de cima encheu a janela de pisca pisca. Eu acho esse japonês um filho da puta. Bela gambiarra para um belo filho da puta. Às vezes eu tenho vontade de quebrar a janela dele com um estilingue, mas sempre escolho as que ficam ao lado. Ou embaixo. Ele saberia que fui eu.
Sobre as luzes: Ele diz que são luzes de fada. Japonês filho da puta. É horrível, forma uma claridade no meu quarto e fica difícil de dormir. Mais que o normal. Transpassa a cortina blackout esse apaga e acende. Acende e apaga. E recomeça tudo de novo, e de novo e de novo. Um monte de luzes coloridas. Pisca. Pisca. Pisca. Qual é mesmo a finalidade, simbologia nisso? Há? Luzes de fada? As fadas não entram no meu quarto, as fadas são incapazes de salvar os aviões caindo dentro dos meus sonhos.
E as luzes... essas também não me livrarão de sentir nada disso. 
É.
Realmente o natal está cada vez mais próximo e as luzes de fada vão iluminar o meu quarto escuro.
Nesse natal não farei pedido algum.
É isso que eu mais peço: não querer pedir.
Não querer pedir por ela.