quinta-feira, 28 de março de 2024

diário de bordo #1

Hoje ancorei no cais frio que é o nono andar.
Foi como receber um abraço gelado na minha paz, ainda assim prontíssima pra sobreviver à algumas horas vivendo sob as vontades tirânicas dela em troca de olhar pra direção do sotavento e saber que eu tenho os olhos dela ali, pra me guiar no meio do iceberg branco e frio... só me resta fechar os olhos e confiar. Eu sempre me preparo pro impacto e aí... Eu sempre caio no canto da sereia. Às vezes ela sequer precisa cantar, só existir, só estar ali no mesmo apartamento branquíssimo de sempre.
Enfim.
A sensação outonal é sempre a mesma, uma confusão sem tamanho. Impossível, improvável, misterioso, sem sol, sem sal, uma crise fodida de beck, sem jet, sem foda, sem ela, sem nada. Só uma falta de amor próprio sem tamanho e uma vontade tremenda de fazer meus olhos brilharem tanto quanto nas viagem anteriores, de fazer o amor ter sentido de novo, uma sensação de que ainda posso fazer minhas mãos suarem quando encostar a pele quente dela. E eu sei que posso, que nós podemos. Mas isso virou uma disputa infindável de quem magoa mais, quem esquece primeiro, quem fica mais tempo longe, uma interminável briga de ego. E aí... os encontros que antes eram tão divertidos, já não são mais tão divertidos e as brigas de tão repetidas já me causam tédio. Eu penso que ela nunca me amou, que não me quer agora também, eu gostaria que o amor dela não fosse explícito só quando eu estou completamente nua esfregando minha buceta em sem rosto ou quando eu tô sentindo o gosto do que é ter certeza absoluta de que ninguém trepa com ela igual a mim, de que ninguém bota nela assim. Só que eu cansei. Eu ia adorar a possibilidade de ser mais que os tapas na cara que eu dou nela, mais que minhas entradas firmes e incansáveis.
É incrível como ela me percebe e me esquece na mesma proporção. Daí eu me enfureço, endureço meu coração e giro o globo, eu corro, transo com outra me distrair. Fujo à nado se preciso for. Viro pirata, olhando nos olhos dela digo que ela não me gera interesse algum e que eu só busco por buceta, drogas e la plata. Mesmo que não seja verdade, só falo porque eu sei que isso atinge seu ego e sua vaidade.
Parece que ela se disfarça com um sorriso bonito pra maquiar a vontade conflituosa que é inerente a existência dela. Mas aí... Ela sorri, acende o baseado, tira a camiseta...  Fica andando pela casa só de calcinha, me serve uma dose de whisky, como se fosse mesmo minha. Faz a gente ter sentido de novo, porque ela faz isso? Não sei, mas quando faz eu nem me lembro das intenções de conflito. Inclusive, quando ela coloca Smiths no toca discos, eu esqueço até mesmo dos riscos que corro à toa. Aí nós nos beijamos e dançamos pelo convés, ela acha graça quando eu danço ou ando na ponta dos pés, então o sorriso dela me derrete, quebra o gelo, atravessamos o iceberg que é minha vontade de estar longe... ela faz tudo voltar a ser incrível, me faz acreditar até mesmo que esse sentimento é possível, é sorte, não revés.




segunda-feira, 25 de março de 2024

ao garoto de cinema:

Gosto das suas falas em fade out, que timidamente me convidam a protagonizar cenas com direção impecável e trilha sonora tão gostosa.
Por trás das câmeras, eu acho que até gosto da tua poesia barata, do cheiro do seu cigarro de Tutti Frutti, das suas meias pretas e da sua camisa em tons claros.
Eu gosto, cara, eu juro!
Eu gosto dessa sua vibe meio James Dean, com a barba sempre feita e até curto esses teus beijos afobados depois de cada take nosso.
Você sabe que eu não tenho dom nenhum pra ser mocinha ou princesa... não quero ser salva de nada! Então o que mais gosto é que você é totalmente consciente de que não será nunca minha prioridade e que justamente você não vai protagonizar meus filmes comédia romântica de sessão da tarde. Não poderá me ter pra sempre porque esse filme não é longa metragem, meu lado B do cinema, mas quando você entra em cena...
Cara, sério, eu perco a fala, o timing...
Juro, você é fora do normal.
Ai, ai, garoto de cinema...
Tudo acontece depois da claquete! Seus olhos claros são holofotes... Me miram e me tiram o foco. Produzimos uma intensa série de amor quando você entra em mim e também quando sai logo após.
E quando eu menos espero, você vai e repete tudo, de novo e de novo, e de novo... sem pudor, sem medo... Isso segue um roteiro divertido e que eu jamais seria capaz de imaginar.





no guardanapo 11

Transformo tudo que gosto em ti, em poesia
Para que assim...
...quem sabe...
 ...você se levante dessa sua melancolia, e
se ponha a dançar no quarto, no corredor, na rua
Quem sabe um dia feliz?
Quem sabe um banho de chuva?





sexta-feira, 22 de março de 2024

tsumami

Deitada ao meu lado na cama, ela sorria aquele sorriso particular dela, cara de danada, em total satisfação por ter me feito chegar até aqui tão fácil, agora ela tem um pouco da minha companhia em total desarmonia com a sua rotina morna, organizada e calma. Eu chego pra bagunçar um pouco de tudo e ela gosta, eu sei que gosta... eu gosto muito mais.
Penso que ela é linda quando a vejo assim tão de perto, tão crua, nua, tão minha... Tão na minha.
Gosto de pensar que ninguém nunca a viu assim, desse ângulo tão artístico. Existe algo mais lindo que ela me olhando de cima? Eu não sei, mas toda vez meus olhos acompanham as expressões deliciosas enquanto meus lábios, língua e dedos fazem um passeio atrevido por ela... e assim capturei uma imagem dela na minha mente que só meus olhares sedentos conseguiriam ver. Beijei seus lábios e ela retribuiu com afeto. Isso sempre me traz um pouquinho pra mais perto dela, sempre me deixa mais aberta e só eu sei como eu me mantenho fechada pra caralho. E pra ser honesta, eu gosto tanto.
Ela incendeia minha alma, me proporciona sentimentos e momentos deliciosos.
Faz festa no meu corpo, dança com a minha nudez, pinta e borda com a minha timidez...
A madrugada tem um charme que eu não sei explicar, chega a ser atraente ao ponto de eu morar na vida dela nas curtas horas madrugadeiras. Fazer morada nas curvas de seu corpo e tudo mais. E agora.... Eu não sei querer nada além de ser engolida por essa tsumami.







terça-feira, 19 de março de 2024

no guardanapo 10

Vivendo
pelo prazer de fazer
e
desafazer a cama com você.




segunda-feira, 11 de março de 2024

entre dúvidas

Não é desamor, é saudade o nome do que eu sinto
Será que eu ainda mexo com você, igual você mexe comigo?





sábado, 9 de março de 2024

só proponho alimentar seu tédio

Toda manhã que eu acordo ao lado dela sempre acontece o mesmo, eu sei. Mas eu fico pra ver o que acontece na esperança de um dia ser diferente. De tudo voltar a ser como era antes entre a gente.
Pela manhã, acho que o encantamento acaba. Não sei, só sei que quando os raios de Sol invadem o apartamento, ela lembra de quem eu sou, de quem fomos, de toda a história... aí o gelo descongela e volta a ser um rio de mágoas, e eu com meu barco furado navegando entre frases com ataques, sofrendo com olhares farpas.
Às vezes eu nem me defendo mais...
Por que eu sou assim, aliás?
O dia seguinte é sempre nublado. As nuvens de situação mal resolvidas chovem paranóias, inundam o apartamento inteiro com uma infinita sensação de mal estar, e continua chovendo até tudo que eu não digo me afogar. E eu juro que não há nenhum diálogo - por mais claro que seja - que aja como um guarda-chuva pra me proteger das angústias. Tem um ditado que diz que quem está na chuva é pra se molhar, eu nunca entendi claramente qualquer que fosse o ditado, mas eu quero dizer que tudo isso tá ficando chato, às vezes eu me sinto usada, na chuva, fodida e molhada. Me sinto oferecendo meu melhor pra alguém que não me oferece nada, além de companhia pra um baseado, uma dose de whisky ou vinho e uma foda bem dada. E tudo bem! Eu não estou me incomodando com isso também... Mas é que eu preciso das coisas claras.
Mais nada.
Eu não sei dizer se é desilusão, frustração ou só um desapontamento vital... Mas eu sei que tudo sempre vai ser assim... Igual. Quando amanhece, ela me repele, diz que eu não presto e sou filha da puta. O azar dela é que eu sou estourada, repito palavras, acuso também. Rapidamente me destempera. Ela grita, aí vamos além. Me desestabiliza emocionalmente, mas eu sou ótima em fingir que não me atingiu e que eu tô bem. Mágoas são grãos de areia, mas se eu parar pra ver tem mais areia aqui do que na praia logo ali.
Ela grita, eu digo que amo. Sempre. Ela que diz que não.
Essa maldita não tem coração.
Daí eu vou embora.
Alguma dias depois ela me liga, com aquela voz dela... E tanto faz, uma mágoa a menos, uma mágoa a mais... o ciclo segue intacto, intocável, blindado pelas minhas projeções e pelas expectativas dela.
E eu volto, subo até o nono andar com a mesma cara deslavada... aí eu percebo que eu sempre tô pronta pra outra e esquecendo a última.
Igual hoje.
Igual semana passada.




quinta-feira, 7 de março de 2024

ai, flor...

Querida flor.
Bom dia.
Boa tarde.
Boa noite.
Como têm sido, pra você, os dias na terra onde o céu é mais azul? Espero que você continue bem e brilhando tanto quanto o Sol.
Flor, se achar que isso não é mais uma pauta cabível, eu entendo e respeito e inclusive sugiro que não leia o restante dessa carta.
Mas se você já está lendo essa linha, eu preciso que você me entenda.
Flor... Eu nunca me esqueci do sabor que tem seu beijo. Da sua voz. Do seu sorriso encantador, que eu queria igualzinho na cara de um filho, sorriso esse que é dado, sincero, calmante... e nunca me esqueci principalmente da sonoridade gostosa do teu sotaque. Confesso, flor, que já perdi muitos detalhes de nós porque os anos foram implacáveis e minha memória nunca foi das melhores, ainda mais que eu continuo sendo maconheira e às vezes o tico e o teco não se conectam. Eu gostaria de me lembrar da textura dos seus cabelos e da sua pele. Eu gostaria de tanta coisa, aliás.
Eu preciso mesmo te dizer que eu sei que já se passaram tantas horas, meses e dias desde nosso último contato, mas eu ainda não me despedi da nossa história, ainda sinto como se em algum momento a vida fosse nos colocar frente a frente de novo. Por isso insisto em sentir. Talvez isso nunca aconteça e seja puro achismo meu... porque, falando por mim, eu ainda acho tudo meio inacabado, um fim muito precipitado. Então eu te guardo, flor. Eu te guardo aqui. Eu vivo a saudade com respeito à alegria de ter vivenciado momentos intensos com você, vivendo sob um estado de total paixão.
Torço aqui para que você ainda pense em mim com as mesmas notas de saudade que eu. Que ainda pense  e cogite que seja possível um reencontro, um abraço, um novo olá... Mesmo que você não possa ou não queira ficar. E mesmo que não seja agora, essa semana, esse mês, esse ano. Não importa.
Eu não gosto do impossível portanto não acredito nele.
Saiba que eu estarei aqui. Te aguardando. Te esperando. Não tenho pressa porque enquanto eu respirar ainda acreditarei que um dia nós nos veremos de novo, apesar da distância às vezes tornar isso um tanto quanto difícil. Mas eu ainda torço pra um reencontro mais maduro e amoroso.
Ah... E dessa vez, eu prometo não me esconder atrás de porta alguma. Eu prometo de dedinho.

                                                                                                                          Com amor, J.




quarta-feira, 6 de março de 2024

monotemática

Abri a varanda da sala e o silêncio que faz no nono andar me fez companhia por alguns instantes. O único barulho que eu tinha dali era o vento correndo e tocando tudo que lhe era possível de barulhento dentro desse apartamento. E o som da minha própria respiração. Ela me observava enquanto eu procurava a seda na minha bolsinha. Eu sempre perco alguma coisa e ela acha graça nisso... E eu só sei que gosto do sorriso e de saber porque ela tá rindo.
Mas além da gritaria silenciosa do amor sendo vivido ali, tudo silêncio, nem parece a cidade que no ápice do verão tem sei lá, um milhão de pessoas por metro quadrado. Tudo que eu tinha ali era o silêncio e algumas gramas de mato. E ela, logo ali... deliciosamente no alcance do meu tato, tornando tudo de mais gostoso da vida em possibilidade. Há poucos metros de mim, contemplando um momento calmo ao meu lado. Prestes a grudar um pouco do cheiro dela em mim, do meu cheiro de maconha nela. E eu quis tanto estar aqui pra isso, tanto, tanto...
Não tinha mais nenhuma droga que pudesse fazê-la distorcer a realidade daqui algumas horas, nem garrafas cujo alto teor alcoólico me fizessem ou cair dentro da calcinha dela ou fugir correndo desse apartamento, como que por acidente mesmo, tão rápido quanto mágica. Nada. Não que eu não queira ambos e sempre, e o álcool seja somente um grande encorajador pras minhas ideias ruins.
Mas enfim.
Enquanto enrolava meu baseado, ela me observava imersa na quietude de seu universo, sentada na sala. Me olhava, não dizia quase nenhuma palavra... Só me disse que conforme os anos passam eu tô mais velha, mais careta e mais chata. Mais nada. E eu concordei. Ela não estava errada. A gente se diverte um tanto juntas no secreto do nosso envolvimento.
Gosto dos diálogos soltos com ela, sem obrigação de agregar nada, gosto das palavras sem compromisso, dos olhares sem direção mas que ainda assim dizem muito sobre tudo que sentimos, porque sentimos muito, porque sentimos de tudo mesmo... quando se trata de nós.
Mas eu estou aqui agora. À vontade no mesmo apartamento branco que me repele, com a mesma mulher de sempre. A diferença é que hoje, agora, eu estou totalmente abrigada aqui, em paz, calma, sem vontade de fugir, é como se nenhuma das nossas rusgas existissem ou tivesse existido. O jazz embalou nossa noite, nosso sexo, nossos baseados e as conversas pré e pós.
É sobre isso, sei que soa monotemático, mas o que seria inovador nisso?
Eu ainda sou a mesma mulher apaixonada de antes, ela ainda me rouba o ar, o eixo, beijos e sentimentos.
Entende?